sábado, 17 de julho de 2010

Sobre o Acampamento Revolucionário Indígena: Mulheres e depoimento

Companheir@s,

Estive no acampamento indígena na manhã quando se dava a ação truculenta do BOPE. Quando chegamos, eu e um companheiro do movimento indígena varamos o cordão policial em torno dos indígenas, e começamos a mobilizar a imprensa e jornalistas que conhecíamos. Não pudemos fazer muito, pois a polícia militar começou a operação covardemente as 05h da manhã, e só fomos avisados quando já era dia.

Quando chegamos lá havia aproximadamente 3 a 4 policiais para cada indígena, e imediatamente começamos a fazer o que podíamos. Levamos uma advogada à 5a DP, onde estavam detidos o documentarista que teve sua câmera quebrada e seus filmes roubados, como ele mesmo registrou em queixa na delegacia. O índio tupinambá estava machucado, com muito medo, e assim que saímos de lá ele foi encaminhado ao IML. Quando estávamos na 5a DP imediatamente um funcionário da FUNAI, supostamente "ouvidor", nos interpelou agressivamente, enquanto outro nos fotografava. Os enfrentamos e a resposta cínica foi que as perguntas e as fotos eram porque eles eram "curiosos".

Quando voltamos ao acampamento, ainda com as crianças muito assustadas e algumas chorando, a menina citada na carta - menor de idade - voltava do hospital. Seus documentos foram tomados pela FUNAI para que não pudessem servir de base para processar o Estado. Como na carta das mulheres está escrito, ela havia abortado uma gestação de aproximadamente 3 meses, e como se não bastasse esta violência, sofreu grande violência psicológica e ameaças para que não levasse o caso adiante.

Nessa hora voltava ao acampamento o índio Corubo, a quem os policiais tentaram prender também sem acusação, mas que havia conseguido fugir. Mesmo sem saber falar bem português, ele foi ao Supremo Tribunal Federal e requisitou uma audiência com o plantonista que lá estava. Ao chegarem no STF a ordem recebida nos portões era de não deixar os índios entrarem.

Fiquei muito impressionado com o que li no Correio Braziliense e no Globo (G1). Os jornalistas que presenciaram tudo estavam chocados com as histórias que ouviram, de crianças de 2 e 4 anos vomitando sangue e se contorcendo por terem tomado gás de pimenta no rosto, enquanto o BOPE arrancava seus pais de seus barracos no frio da madrugada aos gritos "Acorda vagabundos!". Nada disso saiu nos jornais, onde a tônica era que a polícia foi chamada a "fazer cumprir a lei". Ninguém reportou quem os chamou, ou qual lei foi cumprida.

Novamente, como no ano passado em que os Kayapós agrediram um engenheiro da CHESF e foram rotulados de ignorantes e instransigentes, não se deu voz aos índios para contarem sua versão história. Naquele momento, não mostraram a fala em que este engenheiro transformado em vítima pela mídia os provoca e ofende insinuando que a alternativa para as mulheres era a prostituição, e aos homens Kayapó vender pipoca nas obras. Nada disso é de hoje, mas novamente a informação não chega as pessoas. Desta vez a estratégia foi abafar o caso, e amanhã provavelmente nada sairá nos jornais, televisões e portais de notícias.

Estes índios protestam contra a extinção de postos indígenas que ligam suas aldeias a quem os devia proteger - a FUNAI, mas que covardemente nega a eles até mesmo o reconhecimento de serem povos indígenas! Estas autoridades não estavam lá, e não ouviram as maldições que em várias línguas foram lançadas contra elas nas pajelanças daqueles que elas dizem não serem índios.

Estas pessoas que o governo diz não serem índios estavam lá protestando contra a mineração e os grandes empreendimentos em terras indígenas, como a funesta Usina de Belo Monte. Onde houveram estas obras antes no Brasil e em outros países elas somente trouxeram doenças, prostituição, alcoolismo e crime para os povos tradicionais. Isto é inclusão social pela prostituição e a marginalidade nos centros urbanos. Nada diferente dos militares.

Este ato criminoso do Estado Brasileiro contra seus povos originais demonstra não apenas o intenso desprezo e preconceito das autoridades. Demonstra a completa percepção de impunidade na violação dos Direitos Humanos quando os atingidos são os povos indígenas, mesmo estando a 1km do Congresso Nacional, dos Tribunais e do Palácio do Planalto.

Mesmo assim eles continuam no local. Ongs, professores, sindicalistas, voluntários e militantes estão os ajudando de todas as maneiras que podem. Sua comida foi jogada fora pela polícia. Seus cobertores foram levados. Até mesmo a fossa séptica instalada foi retirada. Mas eles continuam no local.

Divulgue a carta das mulheres e esta mensagem.


Marcos Woortmann - voluntário




Terrorismo de Estado contra indígenas do Acampamento Revolucionário Indígena

Brasilia, 11 de julho de 2010



As Mulheres Indigenas do Acampamento Indigena Revolucionario (AIR)

As Mulheres Indigenas do Foro de Organizaciones

Feministas Latinoamericanas y Caribenas

As Mulheres Indigenas do Conselho Nacional de Mulheres Indigenas




Vem a publico manifestar o seu repudio a truculenta ação ocorrida na manha do dia 10 de julho de 2010, quando, uma violenta, irregular, arbitraria, ilegal e etnocida operacao policial a mando do GDF, contando com forcas do BOPE, Força Nacional, Polícia Federal, Policial Civil, Batalhão de Choque Rotam, PM do DF e Cavalaria da PM do DF, cumprindo solicitação da AGU (Advocacia Geral da União) e da Fundaçao Nacional do Indio (Funai), atacou o Acampamento Indígena Revolucionário – instalado na Esplanada dos Ministerios, em protesto pacifico contra o decreto 705609, que extingue Postos Indigenas e Direitos adquiridos, e pedindo exoneração do presidente da Funai, Marcio Meira – no amanhecer, enquanto homens, mulheres, idosos e criancas ainda dormiam.



Sem mandado judicial, a operação deixou inumeros feridos, incluindo duas criancas de 2 e 4 anos, que foram removidas para os hospitais HMIB e HRAN – por conta dos efeitos do gás pimenta. Uma menina de 12 anos foi brutal e covardemente atingida com um jato de gás pimenta no rosto por um oficial do BOPE (o que ficou gravado no celular). Uma militante agredida pelos policiais, gravida de 3 meses, abortou. Uma mãe de familia foi arrastada pelas pernas para fora de sua barraca e agredida verbal e fisicamente.



A operacao policial destruiu as barracas e recolheu roupas, panelas e comidas dos acampados – o que pode ser caracterizado como FURTO - no intento de dificultar a vida dos manifestantes e forçar sua a saida da Esplanada dos Ministerios, pleito do Palácio da Justica há mais de seis meses.



Apoiadores ficaram detidos sem acusação, sendo que um desses, gravemente adoentado e precisando tomar antibioticos, teve o seu direito a atendimento medico negado pelo delegado da 5ª DP. Os responsaveis pela divulgacao midiatica do Acampamento Indigena Revolucionario (AIR), gravando, fotografando e divulgando os eventos, foram os primeiros a ser algemados e detidos, so sendo liberados apos o termino da operacao policial – sendo que um desses recebeu sua camera de volta danificada e sem a fita com o registros das violencias que comprometem as corporacoes policiais envolvidas.



Pelo que foi ouvido de um oficial do BOPE, havia a determinacao expressa de que nao se filmasse nada. Militantes ficaram detidos sem acusacao formal, apoiadores foram ameacados.



O Governo ilegitimo do DF age como um Estado Policial a servico do Ministerio da Justica e do Gabinete Pessoal do Presidente Lula, que forcam uma queda de braco com as populacoes indigenas brasileiras ao se recusar a discutir o fim do decreto e a exoneracao de Marcio Meira.



A indigena vitimada por um aborto, provocado pela brutalidade policial, teve a sua condicao de gestante negada pelo medico do Hospital de Base por conta da pressao da servidora Joana, da FUNAI – apesar dela contar com exames pre-natais que comprovam a gravidez, o medico se recusou a assinar o laudo. O Instituto Medico Legal encenou uma farsa, com a pericia nao fotografando nem relatando os hematomas e demais lesoes de um rapaz Tupinamba, ferido e torturado em sua passagem pela 5ª DP, quando – com pes e maos algemadas – recebeu golpes de cassetete e jatos de spray de pimenta no rosto, a pedido do ouvidor da FUNAI e membro do CNPI (Conselho Nacional de Politica Indigenista), Paulo Pankararu, e seu subalterno, Ildert.



O subalterno da FUNAI, usando oculos escuros, bone e casaco, como se fosse um ladrao que quisesse se esconder, assessorava a sanha etnocida dos policiais na 5ª DP, afirmando que as bordunas recolhidas – que sao um traco de diferenciacao cultural das etnias acampadas - eram porretes comuns (armas brancas), afim de caracterizar uma suposta propensao a violencia dos membros do Acampamento Indigena Revolcionario, negando a condicao de indigenas aos manifestantes, fotografando apoiadores do AIR que entravam na delegacia como forma de intimidar e confraternizando alegremente com os torturadores.



O ouvidor da FUNAI, ao inves de ouvir as revindicacoes dos indigenas – ou ao menos as queixas dos manifestantes nativos, que foram algemados e feridos – se limitava a cruzar os bracos e rir com seu subalterno.



Hoje, dia 11 de julho de 2010, esta no ar uma nota oficial da FUNAI que nega aos manifestantes do Acampamento Indigena Revolucionario a condicoes de indigenas, dizendo que nao pertencem a qualquer etnia nativa, apesar dos militantes do AIR, em sua grande maioria aldeados, possuirem lingua, crencas, cultura e genealogia originarias – alem do reconhecimento expresso do orgao, na forma de carteira de identidade emitida pela Fundacao Nacional do Indio.



Nos, Mulheres Indigenas do Acampamento Indigena Revolucionario, exigimos do Governo do DF e do Governo Federal a imediata devolucao dos pertences apreendidos e total assistencia ao feridos na acao policial do dia 10 de julho de 2010. Nos exigimos uma acao responsavel por parte do Governo Federal, representados por FUNAI e Ministerio da Justica, no sentido de dar uma atencao especial as revindicacoes do AIR, expressas na Carta Aberta ao Povo Brasileiro e nos 11 Pontos do Acampamento Indigena Revolucionario, alem das exigencias particulares de cada uma das mais de 20 etnias representadas no Acampamento Indigena Revolucionario (AIR) ha sete meses.



Nos, Mulheres Indigenas do Acampamento Indigena Revolucionario, exigimos o fim da violencia – fisica, moral e institucional - contra nossos Povos, tanto na Esplanada dos Ministerios quanto nas mais diversas Terras Indigenas (Tis) do Brasil.


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