E essa Maria Rachel?
Será que ela - advogada, ligada ao senador buarque, que fala tanto em
justiça e cidadania e se refere aos povos nativos como "meu povo" -
não vai se manifestar sobre as violências cometidas pelo seu amiguinho
Márcio Meira - amigo dela, deixo claro - contra os indígenas?
Ninguém aí do Rio de Janeiro vai se pronunicar sobre as barbaridades
cometidas aqui? Aonde estão os apoiadores? Cadê a militância? Cadê
aquela rapaziada tão entusiasmada quando se trata de
comparecer/aparecer em eventos que tratam de temas ligados à questão
indígena? Cadê aquela gente tão mobilizada quando se trata de ir
"beber uma "cervejinha lá fora"?
Cadê aquele pessoal que lambe os beiços quando fala de suas viagem às
aldeias no Acre e que não pode ouvir falar de uma sessão de ayuasca
que larga tudo e sai correndo para comparecer?
Estamos sob cerco militar, a água cortada, as barracas de lona, onde
vivíamos, todas destruídas pelo GDF; os banheiros químicos, o
chuveiro, a comida, panelas, pratos, colheres e pertences pessoais
(ROUPAS, DINHEIRO, DOCUMENTOS, REMÉDIOS, ETC), todos apreendidos.
Inclusive, meu filme Takwara (fruto de 4 anos de trabalho, propriedade
dos Kamayurá), todas as minhas anotações, todos os meus telefones,
todas as minhas pesquisas feitas durante esses meses de resistência,
além de toda a minha medicação - tive um problema sério de saúde -
tudo está apreendido pela polícia.
O prazo de devolução se esgotou há 24 horas e nenhuma autoridade sabe
responder aonde está. Fui segunda até a sede da 1º Comando da PM do
DF, que fica dentro de um complexo militar, e percebi que a sede da
ABIN fica bem ao lado, dentro do mesmo complexo - então entendi
tudo...
A PM ronda em seus cavalos (cavalaria), viaturas ficam estacionadas 24
horas em torno do acampamento, a PM liga os holofotes e as sirenes à
noite - para atrapalhar o sono. Os ônibus e viaturas do BOPE estão
"escondidos" no estacionamento dos Ministérios próximos, prontos para
qualquer eventualidade.
Apesar da pressão, sem comida, sem roupas, sem medicação, dormindo ao
relento e intimidados pelas forças de segurança, RESISTIMOS.
E os amigos dos índios, aonde estão? Quem é que vai se pronunciar?
Aonde estão os defensores dos Direitos Humanos? Quando os indígenas do
Maracanã vão se pronunciar? Cadê a carta deles? Não vão se
expressar? Cadê a manifestação do Bessa Freire, tão "amigo" dos
índios? Cadê o Pro Índio? Os indígenas domiciliados no RJ não irão se
pronunciar? Cadê a comitiva para a gente ir buscar na rodoviária?
Cadê o povo do Museu Nacional? E os antropólogos, os linguistas?! Aonde estão?!
E o Zé Maria, Ana Penido e os demais "amigos dos índios", aonde estão?
E todos aqueles que filmam, fotografam, pintam, gravam, escrevem,
estudam, assessoram, traduzem, compilam estórias, ganham a vida e
fazem suas carreiras com a temática ou com a questão indígena? Cadê
esse pessoal?
Cadê a responsabilidade moral dessa gente? Aonde se esconderam todos?
Com que óleo de peroba vão lustrar a cara-de-pau para voltar a
trabalhar com essa gente que sofre aqui com suas famílias?
Não sabe que a FUNAI negou, em nota oficial, a condição de indígenas
aos mais importantes cantadores e pajés da etnia Tenetehara? Não sabe
que a Funai declarou que os indígenas acampados não pertencem a etnia
alguma? Não sabe que mulheres e crianças foram agredidas aqui???
Não sabe que - aqui, na Capital Federal - Paulo Pankararu e Ildert da
Funai negaram a identidade indígena a um Tupinambá de Olivença dentro
da delegacia para deixar a polícia civil à vontade para torturá-lo?
Que a servidora Joana, da Funai, esteve no hospital de base,
assessorada pela Polícia Federal, para forçar o médico para negar a
condição de grávida à índia Guajajara que abortou durante a operação
policial? Que estão nos cercando, intimidando, e não deixando entrar
comida?
Não sabe que o BOPE tomou a nossa câmera e desapareceu com a fita que
registrava a violência, a brutalidade e a covardia policial contra
crianças, gestantes, idosos e homens e mulheres indígenas - bem
defronte ao Congresso Nacional?
Não sabe que fizeram a ação em um sábado, pela madrugada, quando a
Esplanada está deserta, e interditaram as vias para evitar passagem de
testemunhas? Não sabe que impediram os apoiadores que chegavam de
fotografar ou mesmo se aproximar?
Não sabe que toda a minha lista de telefones, apreendida pela polícia,
está grampeada? Que os indígenas, ligados ao Movimento, estão
proibidos de entrar na Funai? Que o STJ, após a operação policial
extra-judicial e criminosa do dia 10 de julho, negou a nossa entrada?
Que a situação do governo brasileiro, no tocante à questão indígena,
ficou insustentável?
Não sabe que há uma convocação para que os índios de todo o Brasil
venham apoiar os parentes aqui? Que o Marcos Terena criou o Movimento
10 de Julho para derrubar o presidente da Funai de uma vez por todas e
fazer com que nunca esqueçam do último sábado que será lembrado como o
Dia da Infâmia?
Não sabe que nós, indígenas e apoiadores da AIR (Acampamento
Revolucionário Indígena), estamos passando o pão que o diabo amassou?
Não sabe que há famílias inteiras presentes aqui, com mulheres e
crianças pequenas?
O venerável Raoni Metuktire esteve aqui, mais uma vez, expressando seu
apoio e sua solidariedade. Dessa feita, lembrou bem de meu pai e
conversou bastante comigo sobre o passado. Mas, cairam na besteira de
aceitar mais um convite do ministério da justiça para conversa,
convite intermediado pelo ministro da cultura, que esteve conosco no
fórum da biodiversidade, e o Raoni ficou puto ao perceber que, ao
invés de ser recebido pelo ministro, seria recebido por assessores e
energumenos do naipe de paulo pankararu - assessor de polícia que
ostenta o título de ouvidor da funai. A grande liderança, nossa maior
referência, foi a primeira a pular fora da reunião - "só converso olho
no olho com o Ministro" - os outros sairam depois.
Raoni, mais uma vez, prometeu uma comitiva de guerreiros. Mas não tem
recursos para enviar.
O Governo Brasileiro está massacrando indígenas a 100 metros do
Congresso e a uns 20 metros do palácio da justiça e NINGUÉM SE
PRONUNCIA.
Caro João Américo Peret, o senhor sabe do meu respeito e consideração,
não apenas por ser amigo e contemporâneo de meu pai (que era mais
velho), mas também pelo seu caráter, por sua luta pelos direitos dos
Povos Originários e por sua história de vida.
O senhor é um escritor, um pesquisador e um jornalista - a quem
admiro, como lutador e como amigo - que criou a sua família, com muito
suor e muita batalha, eu sei, trabalhando com a questão indígena,
sempre ao lado dos Povos Originários.
Não nos vemos há meses, estou em Brasília há um bom tempo, não sei se
você está a par do que acontece em Brasília - e do que acontece no
Brasil, a partir da publicação do Decreto 7056/09. Mas seria muito bom se
informar (o blog do Mércio Gomes está acompanhando). Mais do que se
informar, seria importante um pronunciamento seu e de todos aqueles -
artistas, escritores, cineastas, antropólogos, linguistas, etc. - que
há décadas constroem suas carreiras produzindo sobre - ou com - os
povos indígenas e/ou tiram da cultura, da língua, da espiritualidade e
da imagem dos Povos Originários o seu ganha-pão.
Respeitosamente aguardo um retorno.
Atenciosamente,
Murilo Marques Filho
PS: Caso não tenha conhecimento, a grande mídia televisava participou
da grande farsa que foi a cobertura da operação do dia 10 de julho de
2010, não registrando a brutalidade contra crianças - duas crianças,
de 2 e de 4 anos, foram internadas em hospitais de Brasília por conta
da ação do spray de pimenta, uma terceira vomitou sangue.
Caso não tenha conhecimento disso, sugiro que assista no blog do
Acampamento Indígena Revolucionário (AIR), a imagem de Yashmin
Guajajara, de apenas 12 anos, levando um jato de spray de pimenta no
rosto quando protestava contra a prisão do parente Adrin Guajajara.
Caso o sofrimento de Yashmin não o comova, é sinal de que o coração congelou.
Abraços sinceros,
Murilo
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