quarta-feira, 27 de janeiro de 2010

Poço com radiação permanece aberto em Caetité

Mesmo após notificação da Secretaria de Saúde da Bahia e do Inga (Instituto de Gestão das Águas e Clima), água segue sendo consumida pela população

26 de Janeiro de 2010


© Greenpeace/Lunaé Parracho

Ativistas do Greenpeace protestaram em frente ao prédio da Secretaria de Recursos Hídricos de Caetité, município do sudoeste da Bahia que abriga uma mina de urânio operada pela estatal Indústrias Nucleares do Brasil (INB)



CAETITÉ (BA), BRASIL — Mesmo após notificação da Secretaria de Saúde da Bahia e do Instituto de Gestão das Águas e Clima, água segue sendo consumida pela população

Ativistas do Greenpeace protestaram em frente ao prédio da Secretaria de Recursos Hídricos de Caetité, município do sudoeste da Bahia que abriga uma mina de urânio operada pela estatal Indústrias Nucleares do Brasil (INB), pelo descaso das autoridades locais em relação à saúde da população rural do município.

Na última quinta-feira, dia 21, a prefeitura de Caetité e a estatal INB (Indústrias Nucleares do Brasil) foram notificadas para suspender imediatamente o uso de água de três pontos (entre eles um poço em Barreiros, zona rural da cidade), onde detectou-se a presença de radioatividade além do permitido pelo Ministério da Saúde.

A INB não deu qualquer satisfação sobre que atitudes tomou acerca dos dois pontos de água radiotiva que foram encontrados no terreno de sua mina. Quanto à prefeitura, ela simplesmente não moveu sequer um dedo para impedir o acesso ao poço de Barreiros e fornecer fontes alternativas de água à população local. Essa foi a razão do protesto do Greenpeace, realizado em frente à Secretaria de Recursos Hídricos do município.

A estrela da manifestação foi o Caveira Guy, anti-herói nuclear brasileiro. Enquanto ele oferecia às autoridades locais, em uma barraquinha improvisada, água coletada no poço de Barreiros e acondicionada dentro de garrafas com o rótulo “Água INB, Gostosa de Morrer”, ativistas do Greenpeace, dentro do prédio, convidavam o Secretário de Recursos Hídricos a matar a sede com o líquido contaminado.

Afinal de contas, se não fechou o poço, pode-se supor que ele acredita que análise da água feita pelo Instituto de Gestão de Águas e do Clima do estado está errada. Portanto, não havia razão para que não consumisse a mesma água que a população de Barreiros bebeu e ainda está bebendo.

O secretário Nilo Joaquim de Azevedo, no entanto, demonstrou maior cuidado com sua saúde do que com o bem estar dos eleitores e recusou-se a beber a água contaminada. Nenhuma outra autoridade local apareceu para tomar o líquido.

O poço da comunidade de Barreiros foi aberto em 2007 e fornece água para toda aquela região. Dados oficiais apontam que 15 famílias fazem uso da fonte. Mas uma equipe do Greenpeace foi até o local e constatou que, além de continuar aberto, o poço é utilizado pelo dobro de famílias. Na água, o Inga detectou um índice de radioatividade de 0,3 bq/litro*. O máximo permitido de acordo com a portaria 518 do Ministério da Saúde é de 0,1 bq/litro.

Os outros dois pontos onde o Inga detectou contaminação por urânio ficam na área interna da mina operada pela INB. Num poço, o índice de radioatividade, de 4,07 bq/ litro*, está 40 vezes acima do que é permitido. No outro ponto de contaminação dentro do terreno da INB, um tanque de acumulação de água, a radiotividade detectada foi de 0,23 bq/litro.

A suspensão imediata do uso da água nestes três pontos foi determinada pelo diretor geral do Inga, Julio Rocha, logo após o recebimento dos resultados da última análise realizada pelo órgão na região. A presença de contaminação por urânio acima dos níveis considerados seguros para humanos em poços na área rural do município foi detectada pela primeira vez em 2005.

Em fins de 2008, o Greenpeace conduziu uma análise independente em sete pontos na região e constatou índices de contaminação elevados em dois deles. O Greenpeace levou os resultados para o Ministério Público Federal, que moveu uma ação civil pública contra a INB, e para o Ingá, que decidiu analisar as fontes de água na região.

A INB opera a mina de urânio de Caetité desde meados da década de 90 e apesar de garantir que faz análises periódicas da água em poços do município, não se tem notícia de que elas detectaram qualquer grau de radiotividade nocivo à saúde humana nos pontos analisados – que por sinal ninguém fora da empresa sabe quais são.

Depois que exames independentes registraram a presença da contaminação, a estatal mudou o discurso. Parou de bater na tecla de que o consumo da água local era seguro e passou a dizer que a extração de minério não tem nada a ver com isso e que a radioatividade encontrada na água que serve a centenas de famílias em Caetité é fruto do alto teor de urânio presente no solo da região. Em outras palavras, a INB deu uma de Pôncio Pilatos e lavou as mãos.

O ônus de provar que sua mineração de urânio não tem nada a ver com o problema permanece no colo da INB. A empresa é uma estatal financiada às custas do contribuinte. É portanto inconcebível que ela continue a tratar com tamanho desleixo a saúde não apenas de quem lhe paga as contas, mas que em última análise são também seus acionistas.

Mesmo que ela consiga um dia provar sua inocência na contaminação, isso não a exime, como a principal especialista em questões de urânio em Caetité, a orientar as autoridades e população locais sobre a necessidade de evitar o consumo da água contaminada.

Mas a INB nunca se pronunciou sobre o assunto – a não ser para dizer que o problema não é seu. E nenhuma família jamais foi orientada de forma oficial sobre o caso. As informações que a comunidade ameaçada de contaminação possui foram obtidas através da imprensa.




*Bq/litro - Bequerel por litro - unidade usada para mensurar a radioatividade.


http://www.greenpeace.org

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